ROBSON GOMES
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Nascido na segunda metade do século XVI, William Shakespeare tornou-se o maior escritor da língua inglesa e o maior influenciador dramaturgo do mundo. Suas obras, geralmente relacionadas ao amor, sentimentalismo, além de questões humanas e sociais, tornaram-se base para outras histórias nas mais diversas linguagens, mas principalmente no teatro. E é neste local sagrado, em contato com textos desse grande autor, que um certo ator carioca, nascido três séculos depois, encontrou sentido no seu ofício de atuar e expressa isso através de um monólogo que será visto nesta quinta (30) e sexta-feira (31), às 20h, no palco do Teatro do Parque, dentro da programação do 31º Janeiro de Grandes Espetáculos. Assim chegamos a Thiago Lacerda e ao espetáculo Quem Está Aí?.
>> Leia a coluna Giro desta quarta-feira, 29/01/2025
Hoje, com 47 anos, Thiago conta em entrevista exclusiva ao Giro que seu primeiro contato com o famoso dramaturgo foi entre os 18 e 19 anos. “Conheci Shakespeare no início da minha carreira, quando me apaixonei pelo ofício e decidi que precisava aprender mais sobre este trabalho. Mas mergulhar fundo em suas histórias e conhecer esse autor de verdade foi em 2012, quando Ruy Cortez me convidou para a montagem de Hamlet junto com o [diretor] Ron Daniels”, relembra o ator, que completa: “A partir dessa parceria e do Hamlet, demos início a uma jornada que já dura 13 anos praticamente, de pesquisas sobre a obra desse autor, de montagem de espetáculos, estudos e algumas traduções na gaveta”.
E é o mesmo Ron Daniels que assina a concepção e direção deste espetáculo que o ator apresenta no Recife. Em Quem Está Aí?, Thiago Lacerda traz o universo de três personagens emblemáticos desse escritor: Hamlet, Ângelo (da obra Medida por Medida) e Macbeth. A montagem propõe um mergulho no universo de reflexões e emoções desses três papéis.
O artista conta que essa montagem nasceu de improviso durante a pandemia de Covid-19, em formato on-line, mas que obteve relevância e atemporalidade suficiente para ganhar os palcos físicos após esse tempo turbulento que paralisou o mundo. “Recife vai presenciar um filhote da pandemia, fruto de anos de estudo de uma obra secular, cujo objetivo é única e exclusivamente exercitar a palavra, a tradição oral, a contação de história e fazer com que não nos esqueçamos de que a dureza do tempo e a vicissitude da circunstância faz o ser humano se adaptar. Esse espetáculo é um grito de resistência, uma necessidade de exercitar a arte”, resume.
Ao trazer as reflexões, dores e agruras de três personagens distintos, perguntamos a Thiago Lacerda se algum está mais próximo dele enquanto pessoa. O ator pondera: “Eu diria que sou todos eles, e eles todos me contêm em alguma medida. Não só de forma positiva, mas também me reconheço nas chagas e nos defeitos de cada um. Quando entro em cena não sou eu, mas uso os personagens para me revelar também, me despir para as pessoas e convidá-las a fazerem o mesmo”.
Com a maturidade do tempo e vários personagens épicos e históricos em seu currículo no teatro e na televisão, estaria este artista, com 30 anos de carreira, em busca de reconhecimento e validação de seu trabalho? O carioca diz que não.
“Nunca foi sobre provar nada para alguém. Sempre foi sobre me desafiar e me conectar com os desafios que a carreira foi me oferecendo. Minha trajetória no teatro teve esse caminho meio épico, mas não só nos palcos. Os heróis românticos, os trágicos, os clássicos, eles passam pela minha carreira desde o meu trabalho na TV. Eu fiz Jesus [aqui em Nova Jerusalém, inclusive, por três anos], Tiradentes, São Paulo, Hamlet, Macbeth, Calígula… São muitos personagens biográficos. Mas não era para provar às pessoas que eu era um bom ator. Fiz porque precisava aprender o ofício, era uma necessidade, uma busca legítima. E todos esses personagens me enchem de orgulho. Se eu tivesse feito esses papéis por outras razões, acho que eu não tinha chegado até aqui”, arremata o ator, sem pensar no “ser ou não ser” que o príncipe Hamlet poderia titubear. Thiago Lacerda simplesmente é.