As ambiguidades, bifurcações, manhas e (múltiplos) sentidos da língua – portuguesa – coreografam a letra e a melodia da composição Lambada Exuberante, do cantor e compositor pernambucano PC Silva com o maranhense Zeca Baleiro. O single, lançado nesta sexta-feira (13) em todas as plataformas digitais, explora as potencialidades do idioma através de um jogo de palavras marcado, sobretudo, pela sensualidade nos versos, na estrutura e na proposta de experimentação lançada por um ritmo quente e envolvente sob contornos delineados no Norte do Brasil.
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“A música sempre tem essa face voltada para a sensualidade e, ultimamente, a linha da sensualidade tem sido rompida, em busca de uma sexualização, muitas vezes, extrema. Quando comecei a compor Lambada Exuberante, a ideia foi associar sensualidade numa relação com a língua portuguesa. A nossa língua, que é extremamente rica de possibilidades, como por exemplo a letra X poder ter som de Z, como aborda o início da letra da canção”, diz PC Silva sobre a música incluída no novo álbum, Me Dê Notícias do Universo, previsto para outubro: “É esse convite e uma sinalização de que é possível frequentar esse lugar da sensualidade, e até da sexualização, sem que a poesia se perca já nas preliminares”.
A parceria com Zeca Baleiro nasceu de um encontro entre o fã PC Silva e o ídolo já consagrado na música brasileira intermediado pelo também compositor pernambucano Juliano Holanda, em São Paulo. A troca de mensagens e a ideia de composições sucederam o chope. “Depois desta já compusemos outras quatro músicas. PC é um cara muito musical, bom melodista, bom cantor. A música ficou incrível, estou muito feliz com essa parceria e honrado com o convite pra participar da gravação”, conta Zeca. “Mandei uma ideia que já estava adiantada e que tinha uma parte de que não gostava. Ele devolveu azeitada. Toquei em algumas ocasiões, e quem ouviu adorou, de cara”, recorda PC, outrora assíduo na plateia dos shows de Zeca Baleiro na UFPE quando era estudante de arquitetura e urbanismo.
Parte das gravações ocorreu no estúdio Carranca, no Recife, onde PC Silva trabalhou o instrumental e os vocais, e a finalização foi realizada no Al Gazarra, em São Paulo, cidade onde mora o músico maranhense. A composição é a terceira do novo álbum apresentada ao público – as anteriores são Beira de Mar, música futurista sobre fim do mundo em uma distopia climática, e A Flor das Algarobas, tributo à quase octogenária Severina Branca, ícone da cultura poética do Sertão do Pajeú pernambucano.
A diversidade sonora, poética e temática extraída de singles tão diferentes – e em contraste com a uniformidade predominantemente afetivo-sentimental do disco anterior de PC Silva, Amor, Saudade e Tempo – projeta a versatilidade artística do cantor e compositor pernambucano já gravado por Ney Matogrosso, Simone e Mônica Salmaso e pertencente ao Coletivo Reverbo, conjunto de artistas da nova cena musical do estado do qual fazem partes nomes como Martins, Almério e Flaira Ferro, entre outros.
“Esse álbum tem um pouco mais de diversidade sonora, comparando com o meu álbum anterior. É uma continuação do trabalho. O novo disco traz um Brasil mais percussivo e mais rítmico. Vou até onde consigo ir nessa paquera entre as coisas que cresci ouvindo e o que tenho ouvido atualmente. “Lambada Exuberante” ilustra bem isso. Tem um quê de bolero e também é uma música pra mandar “inbox” praquele contatinho”, destrincha o cantor.
A música da parceria entre os músicos nordestinos contém versos repletos de uma suavidade sedutora e letra com incursões por uma ambiguidade atraente. Vai de “Sua língua em mim / Lambada Exuberante / Gosto interessante / Xis com som de zê” a “Sua boca acesa / Arcada em meu pescoço / Fruto sem caroço / Fácil de morder”, sem desaguar na facilidade de construções previsíveis ou apelos eróticos despudorados. É uma lambada sonora e verbal – mas sem desgoverno da língua pelos caminhos do prazer.