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Luiz Fernando Carvalho fala de seu DNA literário em passagem pelo Recife

ROBSON GOMES
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Luiz Fernando Carvalho esteve no Cinema da Fundação, no Recife – Foto: Ruan Pablo/DP

O fazer artístico é algo muito subjetivo. Portanto, não se pode descrever com palavras o que realmente significa o conceito de quem faz arte. Mas uma coisa todo artista deve ter: um diferencial, uma marca. É assim que chegamos ao diretor Luiz Fernando Carvalho. Este carioca de 63 anos carrega em sua bagagem várias produções de sucesso na televisão e no cinema. E a maioria das obras bebem de uma fonte bastante diversa e relevante: a literatura brasileira, através de autores como Ariano Suassuna.

Em passagem pelo Recife, o cineasta conversou com a coluna Giro sobre a amizade que teve com o autor paraibano de coração pernambucano: “Fui muito amigo de Ariano Suassuna e conheço toda a família até hoje. Fiz vários trabalhos para a televisão inspirados na obra dele, e com colaboração dele, como Uma Mulher Vestida de Sol (1994), A Farsa da Boa Preguiça (1995) e A Pedra do Reino (2007). Fui eu que lancei Ariano na televisão quando ele tinha 70 anos”, ressalta. “Era uma pessoa muito querida”.

O reconhecimento de Ariano ao trabalho de Carvalho pode ser visto, inclusive, numa carta de três páginas escritas de próprio punho no dia 5 de abril de 1999 tecendo elogios ao carioca. “Quero dizer que, mesmo com os cortes, Uma Mulher Vestida de Sol me encantou e comoveu; e com a força e a beleza que você comunicou à peça, um momento particularmente importante da minha vida, serviu para me alentar na convicção de que minha obra valia a pena, uma vez que podia ser vista daquela maneira, por um artista como você”, redigiu o saudoso autor em um trecho da carta, disponível na página oficial do cineasta. 

Além de Ariano, o diretor já filmou, para a TV e o cinema, romances de outros grandes escritores como Raduan Nassar (Lavoura Arcaica), Milton Hatoum (Dois Irmãos), Machado de Assis (Dom Casmurro), Roland Barthes (Fragmentos de um Discurso Amoroso, que originou o curta A Espera [1986]), Eça de Queirós (Os Maias), José Lins do Rego (Riacho Doce), Graciliano Ramos (Alexandre e Outros Heróis) e Clarice Lispector (Correio Feminino e A Paixão Segundo G.H.).

Sobre o ato de levar a literatura para um veículo de massa como a televisão, Luiz Fernando justifica: “Minha relação com a TV foi pautada pela educação. Por esse veículo ser uma concessão pública, eu entendo que um diretor de dramaturgia que entre naquele sistema precisa pegar para si a missão de não só buscar resultados de audiência, mas também abraçar um desafio maior, que é o de ajudar a formar cidadãos através de uma estética dos sentidos. E ao desconstruí-lo, usando a televisão como um canal de cidadania, podemos fazer o público imaginar um outro mundo, uma outra narrativa que não aquela empurrada pela dura realidade todos os dias, goela abaixo”.

Passado, presente e futuro

Responsável por dirigir novelas na TV Globo como O Rei do Gado (1996), Meu Pedacinho de Chão (2014) e Velho Chico (2016), uma obra em especial está em evidência: o remake de Renascer, em que ele assinou a direção da primeira versão do folhetim de Benedito Ruy Barbosa, em 1993. “Enquanto diretor, não pude apreciar a atual releitura [dirigida por Gustavo Fernández] porque coincidiu com o momento de finalização de outro projeto. Mas tem muitos atores que eu lancei ali, parceiros de trabalho que estão de volta nesta nova versão… Espero que eles estejam fazendo jus àquele pedaço do país, que para mim foi tão transformador e fundamental. Estou torcendo de longe”, desconversa educadamente.

Como ele não vive de passado, as atenções desse mago do audiovisual estão voltadas para o agora. Desta vez, Clarice Lispector foi a inspiração para sua obra mais recente: o filme A Paixão Segundo G.H., protagonizado por Maria Fernanda Cândido, em cartaz no Recife no Cinema da Fundação do Derby e do Museu até a próxima quarta-feira (24).

E foi recorrendo a esta mesma autora, que passou a infância na capital pernambucana,  que Luiz Fernando Carvalho evitou falar de futuro. “Clarice me ensinou nesse filme que ‘a vida só vale ser vivida se for em segredo’. Então, assim como todos temos segredos, eu também tenho o meu”, encerra ele, de maneira tão enigmática quanto o eterno mistério se Capitu traiu Bentinho no clássico Dom Casmurro, que originou mais uma obra-prima da teledramaturgia com sua assinatura na direção: a minissérie Capitu (2008).

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